O governador Mauro Mendes (União) autorizou a aplicação de recursos da autarquia Mato Grosso Previdência (MT Prev) em um fundo de investimento que venceu o maior lote do leilão 01/2024 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para a construção de linhas de transmissão.
Até 19 de fevereiro deste ano, o MT Prev já investiu R$ 3.389.063,04o no BTG Pactual Co-Investimento em Linha de Transmissão. A previsão, segundo o presidente do MT Prev, é investir R$ 5o milhões, apesar do documento formal de compromisso de investimento no fundo destacar que podem ser investidos até R$ 200 milhões dos aposentados neste fundo.
O fundo do BTG Pactual arrematou o maior lote do leilão 01/2024, realizado em março do ano passado, e deve construir em até 60 meses linhas de transmissão com extensão de 411 quilômetros, localizadas no estado do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. O fundo prevê uma receita anual permitida de R$ 111,7 milhões com a linha de transmissão.
Lotes do Leilão Aneel 01/2024
As empresas da família do governador Mauro Mendes também participaram do leilão 01/2024 da Aneel. A Sollo Energia S.A. compôs o Consórcio Energia MS com a Hersa Engenharia e Serviços Ltda. e a FM Rodrigues & Cia Ltda.
A empresa FM Rodrigues & Cia Ltda. pertence ao mesmo grupo de sócios que constitui a Brasiluz Eletrificação e Eletrônica Ltda, empresa que venceu o lote 8 do leilão 01/2024.
A FM Rodrigues & Cia Ltda. é intimamente ligada às empresas do governador Mauro Mendes por ter composto o Consórcio Cuiabá Luz, voltado para investimentos na implantação de lâmpadas de LED na capital mato-grossense, cujo contrato de R$ 712 milhões chegou a ser alvo do Tribunal de Contas do Estado.
Atualmente, a FM Rodrigues & Cia Ltda tem sociedade no Consórcio LT Norte juntamente com a Sollo Construções. Em 2017, o consórcio venceu o lote 14 de outro leilão de linhas de transmissão realizado pela Aneel.
Em 2022, o Consórcio Norte, das empresas Zopone Engenharia e da Sollo Engenharia, venceu outro leilão da Aneel para a construção de uma linha de transmissão no Acre. As obras foram contestadas na justiça por conta da destruição de Sumaúmas na floresta amazônica, espécie conhecida por ser a “árvore da vida” para os indígenas da região.
Investimento de risco
O próprio instrumento particular de compromisso de investimento assinado pelo BTG Pactual e pelo MT Prev aponta que pode ocorrer “perda total” do capital investido no fundo.
Ao assinar o compromisso, o MT Prev reconhece que “tem pleno conhecimento dos riscos relativos à sua aplicação na Classe e à possibilidade de ocorrência de variações no patrimônio líquido da Classe, inclusive de perda total do capital investido”.
A chamada “diversificação da carteira” do MT Prev ocorreu em meados de 2023, quando o órgão passou a descentralizar os investimentos em título público, passando a aplicar recursos no mercado financeiro.
Apesar dos títulos públicos ainda representarem a maioria dos investimentos, o MT Prev abriu as portas para investimentos considerados de risco. Até o fim de 2024, cerca de 12,23% dos investimentos são em renda variável, enquanto o restante, 87,77%, é em renda fixa.
Em dezembro do ano passado, o MT Prev pagou R$ 522.638,79 para “regularização da despesa de taxa de custo de oportunidade do fundo Patria Private Equity VII”. Os detalhes dessa despesa não são públicos.
O MT Prev investe nos seguintes fundos de renda variável: FIP Pátria Infraestrutura V; KINEA Equity Infra I; BTG Pactual Infraestrutura III (que inlui o fundo de linha de transmissão); Pátria Private Equity VII; Vinci Capital Partners IV Feeder Mult e Tarpon Atlanticus FIC FIA, de acordo com o Relatório Anual de 2024.
Além de linhas de transmissão, o MT Prev também investe em um fundo dedicado à construção de galpões. É o caso do SPXSYN Desenvolvimento de Galpões Logísticos Feeder Institucional FII Responsabilidade Limitada, no qual a autarquia investe R$ 3 milhões.
De acordo com Elliton Oliveira de Souza, diretor-presidente do MT Prev, a autarquia não tem matriz de riscos ou plano de contingenciamento de um investimento em específico.
“A gente não tem um para cada, a gente tem uma matriz de risco em que a gente aplica os principais fundamentos de trazer uma segurança para o investimento que é fazer um credenciamento bem feito, e no credenciamento investigamos tudo, até a vida dos sócios. A gente analisa se o agente do mercado para este tipo de investimento é desse grupo de primeira classe, primeira prateleira classificada pelo Banco Central e aplicamos o conceito da diversificação, que é fundamental. E após todas essa análise que passa por inúmeros agentes do MT Prev, nós ainda submetemos isso a uma consultoria externa, para fazer uma análise do produto do investimento”, afirmou Elliton.
“Se a consultoria falar que não recomenda, a gente aborta o investimento. Então o plano que a gente tem é um plano macro e não o plano de especificamente um investimento”, disse o diretor-presidente.
Estas análises são feitas pela empresa Mais Valia Consultoria LTDA, do Rio de Janeiro, vencedora da licitação para realizar o serviço.

Falta de transparência
O Governo alega que os investimentos no BTG Pactual Co-Investimento em Linha de Transmissão foram aprovados em reunião realizada pelo Comitê de Investimentos no dia 16/06/2023. Apesar disso, a ata da reunião não tem qualquer menção direta ao fundo.
Em entrevista ao PNB Online o diretor-presidente do MT Prev confirmou que os termos de compromisso de investimentos firmados com os fundos não são publicados pela autarquia. Além disso, depois de assinados os acordos, os “chamados de capital” – quando fundos oferecem aos cotistas a possibilidade de mais investimentos – também não são publicados detalhadamente nas atas de reuniões do comitê.
“Estes termos de compromisso de FIPs cada um está dentro do seu processo”, afirmou Elliton. “A gente pode até começar a publicar, mas a gente entende que a ata de reunião do comitê de investimento e a nossa carteira são suficientes”, declarou.
Estes investimentos constantes, que devem ser feitos até atingirem a marca de R$ 50 milhões (no caso do fundo da linhas de transmissão), são divulgados em um documento chamado APR (Autorização de Aplicação e Resgate), que é publicado no CADPrevo, do Ministério da Previdência Social e no site do MT Prev.
A última APR do BTG Pactual Co-Investimento em Linha de Transmissão foi publicada no dia 19 de fevereiro deste ano. O documento informa a aplicação de mais R$ 1.366.447,50.
Presidente diz não conhecer destino do dinheiro
Elliton afirmou que não sabia de investimentos e participação societária do filho do governador em empresas que, a exemplo do fundo do BTG, também participaram do leilão 01/2024 da Aneel. Souza negou ter conhecimento de que os investimentos podem chegar até empresas parceiras do filho do governador.
“O que a gente avalia o nosso negócio, a nossa participação, é com o BTG. A gente não sabe necessariamente, quando você entra no lançamento do FIP, quais serão as empresas que eles vão conseguir comprar, o que eles vão fazer. A gente sabe quais segmentos eles vão investir”, declarou.
“Uma vez que é feito o investimento, a gente vai no início de cada semestre para São Paulo e conversa com o gestor. Se foi uma empresa que foi adquirida, como está o andamento da empresa, e também o saldo que ainda tem no fundo. Então, o que a gente tem conhecimento é que foi vencido o leilão dessa linha de transmissão, e parece que tem um excedente de produção de energia, principalmente energia fotovoltaica, mas não tinha os investimentos em transmissão”, declarou Elliton.
Retorno do fundo
Segundo Elliton Souza, o fundo de linha de transmissão dura 10 anos, realizando chamado de capital durante cinco anos, para a realização dos investimentos, e nos outros cinco anos o cotista recebe o retorno destes investimentos. Segundo ele, os prejuízos iniciais ocorrem porque os fundos ainda estão em fase inicial de investimento. A expectativa, conforme ele, é de que o retorno seja de 20% mais o IPCA do período.
“Nestes primeiros cinco anos é o que chamamos de curva J. Está agora somente na fase de gastar, de fazer o investimento em si. Então, nessa fase, há um aparente prejuízo”, declarou. “Todos esses FIP nossos estão na curva J, não é que esse recurso é um prejuízo, é a valorização da cota que fica negativa, porque aquele investimento não está tendo receita, não está operando ainda. Depois que entra em funcionamento, no caso da linha de transmissão, a cota é reavaliada, é feita uma auditoria e eles pedem para desinvestir, vender para um estrangeiro, a compra por um grupo maior, aí são várias estratégias de vendas”, afirmou.
Questionado sobre de onde saiu a informação em relação ao fundo de linhas de transmissão e como os membros decidiram investir no fundo, Elliton afirmou que o MT Prev realiza um “mapeamento” do mercado para o tipo de investimento pré-aprovado.
O que diz o MT Prev
Por meio de nota, o MT Prev respondeu aos questionamentos da reportagem sobre a diversificação dos investimentos e as aplicações em renda variável. Veja a nota completa:
Em atenção à solicitação de informações sobre os investimentos realizados pelo MTPrev no BTG Pactual Investimento em Linhas de Transmissão Institucional Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura – Responsabilidade Limitada, esclarecemos o que segue:
1. Autorização do investimento:
O investimento foi aprovado em reunião do Comitê de Investimentos do MTPrev, realizada na data de 16/06/2023, bem como nas contas anuais do Mtprev, conforme parecer do Conselho Fiscal e aprovado pelo Conselho de Previdência conforme resolução número 69/2024.
2. Motivações para a aplicação no fundo:
A decisão de investir no referido fundo foi fundamentada em diretrizes de diversificação de portfólio, busca por ativos com perspectiva de retorno estável no longo prazo e aderência às políticas de investimento dos RPPS. As linhas de transmissão representam um segmento de infraestrutura de base, com contratos de concessão de longo prazo e remuneração previsível, o que contribui para o equilíbrio atuarial e financeiro do regime.
3. Avaliação de riscos antes da efetivação do investimento:
Foi realizada análise de risco institucional e diligência prévia (“due diligence”), bem como parecer de consultoria especializada e observância aos critérios estabelecidos pela Secretaria de Previdência do Ministério da Fazenda. Os riscos relacionados ao fundo – tais como regulatórios, operacionais e de mercado – foram considerados aceitáveis dentro do perfil de risco permitido ao RPPS.
4. Mensuração do valor aplicado:
O valor aportado foi definido com base no limite de alocação permitido para ativos de infraestrutura na carteira do MT Prev, respeitando os percentuais máximos fixados pela Resolução CMN nº 4.963/2021, que regula os investimentos dos regimes próprios. A decisão também considerou o espaço fiscal no momento da aplicação, o valor patrimonial do fundo, o cronograma de chamadas de capital e a expectativa de retorno.
5. Retorno do investimento desde o início da participação no fundo:
Por se tratar de um FIP, o mesmo se encontra em período de chamada de capital.
Por fim, reforçamos o compromisso do MT Prev com a transparência, a segurança dos recursos previdenciários e a conformidade com os marcos legais que regulam os investimentos dos regimes próprios.