Mato Grosso: o Estado que perdoa R$ 30 em cada R$ 100 arrecadados — mas só para os grandes
Relatório do TCE expõe farra de isenções fiscais que beneficia multinacionais e gigantes do agronegócio, enquanto pequenos negócios e serviços públicos sofrem com a falta de recursos.
Em Mato Grosso, a política fiscal tem dois pesos e duas medidas: para empresas bilionárias, há bilhões em renúncias tributárias; para pequenos e médios empreendedores, só a cobrança pesada de sempre. Entre 2019 e 2023, os benefícios fiscais concedidos pelo governo estadual saltaram de R3,4bilhões paraR 10,8 bilhões — um aumento de 215%. Desse total, 96% são descontos no ICMS, imposto que deveria financiar saúde, educação e infraestrutura, mas que, na prática, tem servido para engordar o lucro de grandes corporações.
Os números estão no relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT) referente a 2023. O documento revela que apenas dez empresas concentram 27,4% de todas as isenções. Entre as beneficiárias estão nomes como JBS, BRF, Bunge, Marfrig e FS Bioenergia — multinacionais e líderes do agronegócio que já faturam bilhões. Enquanto isso, o funcionalismo público enfrenta processos contra reajustes, e áreas como saúde e educação operam com orçamentos limitados.
Quem ganha e quem perde
A indústria de transformação ficou com mais da metade (50,2%) dos benefícios fiscais, seguida pelo comércio (25%) e pela agricultura (8%). Se incluídos os incentivos para exportações, a conta fica ainda mais salgada. O resultado é um Estado que arrecada menos de quem mais lucra e transfere a conta para a população: a cada R$ 100 reais em tributos devidos, R$ 30 reais são simplesmente perdoados.
— É uma matemática perversa: os grandes ganham isenção, os pequenos ganham cobrança — resume um auditor do TCE, que preferiu não se identificar.
Fim da farra?
Com a regulamentação da Reforma Tributária (LC nº 214/2025), os incentivos fiscais devem desaparecer até 2033. Em tese, isso poderia significar mais de R$ 10 bilhões em arrecadação extra. A dúvida, porém, é se esse dinheiro será de fato investido em políticas públicas.
Enquanto o governo de Mato Grosso prega austeridade para servidores e cidadãos comuns, mantém benevolência bilionária com os barões do agro. O cenário repete a velha lógica brasileira: bônus para poucos, ônus para todos.